A menina de 13 anos que teve aborto negado pela Justiça de Goiás conseguiu a autorização para o procedimento, concedido pela presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Maria Thereza de Assis Moura. A adolescente engravidou após ter sido vítima de estupro e, por contrariedade do pai, do hospital, e posteriormente da juiza, teve a interrupção da gravidez, que é permitida por lei, negada.
A decisão da presidente do STJ, proferida na última quarta-feira (24), atende um habeas corpus apresentado pela defesa da menina, por meio da Defensoria Pública de Goiás, e foi informado em primeira mão pela coluna da jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo. A magistrada destacou que a autorização tem como objetivo acabar com o constrangimento ao qual a adolescente foi submetida com todo esse imbróglio. “A situação que se apresenta impõe a imediata intervenção desta corte para fazer cessar o constrangimento ilegal a que se encontra submetida a paciente”, afirma a ministra Maria Thereza.
A presidente do STJ ainda pontuou que a decisão também parte de um ponto de vista pessoal dela. A magistrada denominou a ação da Justiça de Goiás como “presunção absoluta de violência”, já que além de ter sido vítima de estupro de vulnerável, a menina precisou passar por tantas negligências.
Maria Thereza destacou que o procedimento recomendado para a vítima, que já ultrapassou a 30ª semana de gravidez, chamado de assistolia fetal, é recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para gestações tardias. A ministra aproveitou para ressaltar que, embora o pai da menina se oponha à intervenção, há consentimento da própria gestante e também de sua mãe para que seja feito o aborto.
Por fim, argumentou: “Convém salientar, ainda, que a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que proibia o procedimento de assistolia fetal está suspensa por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes”, concluiu a presidente da corte.
O caso ganhou repercussão nacional após a negativa do procedimento de aborto pela Justiça de Goiás vir à tona em reportagem do Intercept Brasil e do O Popular. Quando decidiu interromper a gravidez, a menina estava na 18ª semana de gestação, no entanto, por contrariedade do pai e – de acordo com os portais que acompanharam os autos do processo – impedida pelo hospital responsável, ela precisou recorrer a autorização legal, que também lhe foi negada, estendendo a decisão de que ela mantivesse o feto até que uma cesareana pudesse ser feita, após a 30ª semana.
As apurações jornalísticas dos veículos em questão constataram que houve uma mobilização da própria Justiça para que a adolescente mantivesse a gestação até um parto antecipado, para tentar preservar a vida do feto. A decisão da Justiça goiana gerou comoção nacional e resultou em protestos de ativistas em prol dos direitos das mulheres. Conforme a legislação brasileira, em casos de estupro de vulnerável, o aborto é um direito constitucional.
Após a negativa da juíza de Goiás, a defesa da menina alegou que as decisões do tribunal goiano ignoraram a vontade da vítima e a recomendação médica do profissional que a acompanha, “incorrendo em grave constrangimento ilegal à sua vida e liberdade”. Além de ser uma gravidez considerada de risco, devido a idade precoce da menina, no decorrer do processo ela também apresentou sofrimento psíquico, tendo ameaçado tomar remédios para interromper a gestação sozinha e colocado a própria vida em risco.
Com efeito, o habeas corpus apresentado ao STJ pela defesa cita um parecer elaborado pela equipe do Hospital Estadual da Mulher (Hemu), que atendeu a adolescente em Goiânia. Os médicos afirmam que a antecipação do parto, como sugerido pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), seria um processo doloroso para a menina. O documento técnico confirma, ainda, que a antecipação do parto geraria “elevado risco de complicações”, e que a taxa de sobrevida do feto seria baixa.
Em resposta à decisão do TJGO, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, também chegou a se manifestar nas redes sociais. A representante da pasta afirmou que o Ministério acompanhava a situação da adolescente e mencionou o direito constitucional da menor em realizar o procedimento de aborto.
Na ocasião, Cida lembrou que a legislação brasileira é clara ao dizer que se a gravidez é decorrente de estupro, põe em risco a vida da gestante ou há anencefalia, a mulher tem o direito de interrompê-la. “Como falamos tantas vezes nas últimas semanas, criança não é mãe, estuprador não é pai e a vida de uma criança corre risco se mantida a gravidez. Não podemos admitir nenhum retrocesso nos direitos das meninas e mulheres”, escreveu a ministra.
Com informações da Folha de S. Paulo