O mercado de venda de robôs que disparam anúncios em massa por meio de mensagens instantâneas em aplicativos como o Whatsapp está a todo o vapor. O comerciante digital, querendo lucrar, oferece o serviço para o pré-candidatos nas eleições de 2022, numa tentativa de convencer o político em amplificar sua campanha nas redes sociais. Ou mesmo, o contrário: atacar um possível oponente.
Reportagem do Diário de Goiás esteve monitorando diversos grupos políticos no Whatsapp e viu o serviço oferecido por usuários do aplicativo. O interessado pode negociar disparos semanais, três vezes ao dia, pagando a bagatela de R$ 60,00 durante o período. O vendedor não trabalha com pacotes maiores. “Trabalhamos com metas”, garante. A publicação é disparada em 250 grupos, com no mínimo 100 e no máximo 257 pessoas em cada, podendo alcançar mais de 64 mil pessoas.
O vendedor digital, no entanto, diz que não é possível regionalizar os disparos. Inicialmente o serviço é oferecido em tom comercial mas no contato privado, o comerciante diz que atende também políticos que querem utilizar a ferramenta em suas campanhas. Apesar do impulsionamento de publicações em redes sociais como o Instagram, Facebook e Youtube ser liberado com os devidos critérios, o disparo em massa por meio de robôs no Whatsapp, além de ser ilegal, pode incorrer até na perda do mandato.
Especialistas alertam para uso da ferramenta
Advogados eleitoralistas consultados pelo Diário de Goiás são unânimes em repudiar a estratégia como forma de campanha e reforçam a ilegalidade da prática. “Essa prática de disparo em massa é vedada e pode decorrer em grandes complicações para a/o candidata/o, desde cassação de registro ou diploma, à sanção de inelegibilidade”, explica Nara Bueno.
“Os pré-candidatos e pré-candidatas devem observar alguns cuidados para não infringir as regras e incorrer em disparo em massa, que consiste no envio/compartilhamento/encaminhamento de um mesmo conteúdo (ou mesmo variações deste conteúdo eleitoral), por mensagens instâncias, para um grande volume de usuárias e usuários”, destaca a advogada eleitoralista.
O eleitoralista Júlio Meirelles destaca a parceria que o próprio Whatsapp tem com o TSE no sentido de combater os disparos em massa. “O WhatsApp disponibiliza um canal de comunicação para denunciar contas suspeitas de realizar disparos em massa, o que é proibido. A própria Justiça Eleitoral também disponibiliza um canal para que cidadãos possam denunciar contas suspeitas de fazerem disparos em massa”, explica.
Meirelles alerta para os cuidados que as próprias campanhas devem ter ao estabelecer suas estratégias: disparos em massa podem gerar exclusão da conta pelo aplicativo. “O WhatsApp apura o uso de robôs, perfis falsos, circulação em larga escala de notícias deliberadamente falsa. As contas indicadas que violam as políticas do aplicativo são banidas”.
Mesmo com a permissão da legislação eleitoral em relação a impulsionamento nas redes sociais, Bueno explica que alguns cuidados devem ser tomados. “Existem limites. Na pré-campanha não pode haver pedido explicito de votos e haja a moderação de gastos que devem ser proporcionais a campanha. Os pré-candidatos e pré-candidatas devem observar essas duas limitações que o impulsionamento de conteúdo seja legal”, ressalta. “Eu oriento as minhas e meus clientes que não façam esse tipo de disparo e contratação em massa de mensagens. Pode decorrer uma série de sanções e até mesmo a inelegibilidade, cassação de registro e de diploma”.
Meirelles também segue o mesmo caminho. “Essa prática contraria a legislação eleitoral e tal conduta será apurada e penalizada com rigor pela Justiça Eleitoral nas próximas eleições. É recomendável que os candidatos não se sirvam de robôs, disparos em massa e fake news. Caso insistam no ilícito, colocarão em risco a própria candidatura ou assunção do cargo”, pontua.
‘Alguns candidatos são cooptados por vendedores de sonhos e também de crimes’, avalia marketeiro político
Há dez anos conduzindo o marketing de campanhas eleitorais, o estrategista político Marcos Marinho diz que algumas vezes recebe sondagens de clientes sobre disparos em massa em aplicativos de mensagens instantâneas. Contra a ferramenta, ele desestimula aqueles que almejam ser eleitos aos cargos públicos.
“Tem alguns clientes que vem com essa história de fazer campanha eleitoral como se fossem atacados e aí acabam sendo cooptados por vendedores de promessas, de sonhos e quando não vendedores de crimes. Essa estrutura de se fazer disparo em massa tá mais do que provado que é problemático”, destaca. Marinho reforça aos clientes o que já foi dito: a prática é proibida e não há discussão sobre ser utilizada ou não durante as eleições.
Não é o que acontece com outros candidatos. “Agora muita gente vai tentar vender soluções mágicas para campanha e o candidato menos preparado e orientado juridicamente pode se encantar pelo canto da sereia. Isso é um fato que infelizmente acontece”, explica.
Para Marinho, além de ser ilegal é uma ferramenta que não é efetiva do ponto de vista em conversão de votos. “Não vale a pena também porque é inefetivo. Não adianta mandar um milhão de mensagens e para um bilhão de pessoas que não te conhecem ou que não tem conexão com você. O máximo que você vai conseguir é a irritação do eleitor que não te conhece. Além de ser criminoso, é inefetivo”, pontua.
Para ele, a estratégia em investir de forma legal em impulsionamento nas redes sociais pode até dar certo, mas não sem as tradicionais mobilizações presenciais com ferramentas clássicas: reuniões e visitas presenciais. A conquista da confiança do eleitor presencial para a partir daí, criar um vínculo que possa ser disseminado na rede virtual. “Você [o candidato] tem que cada vez mais cativar a militância e instigar ela a se mobilizar. O voto vem dessa mobilização”, concluiu.