É possível reduzir a desigualdade socioeconômica no Brasil só pela via educacional? Os sociólogos Marcelo Medeiros (Ipea/UnB), Flávio Carvalhaes (UFRJ) e Rogério Barbosa (Centro de Estudos da Metrópole – USP) fizeram uma série de análises com dados estatísticos e confirmaram que sim. Porém, o resultado é muito aquém do que o senso comum costuma acreditar. Se a partir de 1994, ano do Plano Real, tivéssemos um sistema educacional “perfeito” para todos os alunos, a desigualdade no país seria apenas 2% menor do que é hoje.
Por sistema educacional perfeito, os especialistas entendem que é aquele em que todas as crianças e adolescentes do país estão matriculadas regularmente, não repetem de ano, não evadem da escola e após se formar no ensino médio conseguem emprego. O Índice de Gini é a maneira mais comum no Brasil de medir a desigualdade a partir da renda. Conforme o IBGE, o Gini de 2017 no Brasil foi de 0,549, conforme a renda média mensal domiciliar per capita. O indicador varia de zero a um, quanto mais próximo de zero, mais perto de uma situação ideal de absoluta igualdade.
“É fundamental que a desigualdade no Brasil caia. Só que isso é pouco [2%] diante do grande esforço educacional que nós teríamos feito. É pouco diante do grande desafio que a gente tem de combater a desigualdade e a pobreza. A conclusão disso é que nós precisamos de educação e algo mais para combater desigualdade e pobreza. O discurso ‘basta investir em educação que o problema será resolvido’ é um discurso errado”, pondera Marcelo Medeiros, um dos autores do estudo.
Além de efeito diminuto, a mudança no quadro social é mais lenta do que se idealiza. Se tivéssemos tornado o sistema educacional brasileiro perfeito em 1956, no início do Plano de Metas de JK, “só hoje a força de trabalho seria completamente diferente”. Conforme o especialista, “demora meio século” para trocar inteiramente a qualificação do conjunto da força de trabalho. “Meio século é tempo demais para esperar”, avalia.
Conforme o estudo em apresentação no encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), a redução da desigualdade ocorreria mais rápido se fossem adotadas medidas contra a discriminação de gênero, raça e cor no mercado de trabalho e se fosse feita reforma tributária, que diminuísse a regressividade dos impostos – quando os mais pobres comprometem proporcionalmente mais a sua renda para pagar tributos, o que acontece nos chamados “impostos indiretos”, como é o caso do ICMS.
“A educação é necessária, mas não é suficiente. Você tem que complementar esse esforço educacional com uma série de esforços. Isso mostra que gênero e raça são muito importantes. O Brasil tem que também combater essas desigualdades”, acrescenta Medeiros.
O estudo, a ser publicado pelo Ipea e já disponível em inglês, “apoia a ideia de que as cotas [para a inclusão de negros na escola e no emprego] são importantes e que é necessário tornar o mercado de trabalho menos tolerante com a diferença”, assinala o sociólogo.
“É claro que você deve tentar melhorar o nível educacional da população negra desde a pré-escola. Só que isso é insuficiente”, opina Medeiros que defende as cotas para emprego, além das universidades, porque facilita a entrada no mercado de trabalho, “a quem não teve boas escolas no passado, e não vão ter porque não dá para voltar atrás no tempo”.
No caso das mulheres, elas já são mais qualificadas que a mão de obra masculina, mas ganham menos do que os homens. Para reduzir a desigualdade entre homens e mulheres no trabalho, há políticas públicas conhecidas como aumentar ofertas de creche e de escolas de ensino fundamental e outras medidas como melhorar o serviço público de transporte para agilizar o deslocamento das mães, lembra Medeiros. (Agência Brasil)
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