Os integrantes da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), tendo como relatora a desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis, manteve sentença de primeiro grau, para condenar o jornalista José Carlos Brito de Ávila Camargo, conhecido como Zeca Camargo, a pagar R$ 60 mil, a título de indenização por danos morais a CA Produções Artísticas Ltda e a João Reis de Araújo, em virtude de crônica veiculada por ele sobre a morte do cantor Cristiano Araújo, ocorrida em julho de 2015.
Consta dos autos que os autores da ação alegaram que o texto foi escrito e interpretado de forma preconceituosa e com a finalidade de denegrir a imagem, não apenas do cantor falecido, mas também da música sertaneja. Aduziram, ainda, que foram utilizadas cenas do velório e que vários trechos deturpam a imagem de Cristiano Araújo. Ao final, declararam que reconhecem o avanço constitucional da liberdade de expressão, mas que houve abusos e manifestações ofensivas.
Em primeiro grau, a juíza Rozana Fernandes Camapum condenou o réu a pagar para, cada um, a indenização. Inconformado, o jornalista Zeca Camargo interpôs recurso, sustentando ser erroneas as premissas adotadas pela magistrada de primeira instância, pois o recorrente não possui responsabilidade sobre as imagens que foram veiculadas no “Jornal das Dez”, matéria produzida pela emissora que veicula o programa, bem assim que não teve a intenção de injuriar, difamar ou caluniar, a despeito do afirmado pela magistrada, vez que não houve agressão, desprestígio e muito menos humilhação.
Afirmou que a crônica foi incapaz de intensificar ou causar sofrimento intenso, isso se deu pela própria morte do artista, uma vez que discorre sobre o contraste entre o espaço dado ao cantor e cobertura sensacionalista de sua morte, recaindo sobre a cobertura de um falecimento e comportamento de comoção pública e não sobre o gênero musical ou a preferência do cronista. No recurso, o jornalista levantou a tese de liberdade de expressão, prevista na Constituição Federal de 1988, que prevê que o direito de opinião e crítica são inerentes às liberdades de comunicação e de manifestação do pensamento, o que descaracteriza o intuito de injúria, como alegam os autos.
Além disso, atestou não ter havido xingamentos ou mácula de difícil reparação à imagem do artista, pois teria agido dentro da liberdade de expressão e do direito de criticar ao propor uma reflexão sobre comportamentos sociais no Brasil, podendo a manutenção da condenação redundar para censura. Disse ainda que um jornalista não pode ser condenado por questionar a notoriedade de alguém, sob pena de os próximos passos serem questionáveis, especialmente, porque deve haver divergências de opiniões e proteção delas.
Ressalta a inocorrência de ato ilícito, estabelecido no artigo 186, pois somente elaborou a crônica controvertida, não a publicou, nem divulgou, sendo que também não agiu com intenção de violar, pois não caluniou, difamou ou sequer injuriou o artista. Ademais não tem “nada contra a música sertaneja e muito menos contra o artista”, pelo contrário, até teceu pontuais elogios, não havendo, portanto, que se falar em dano.
Afirmou que não ocorreu abuso do exercício de um direito, reafirmando que apenas se utilizou do acontecimento do falecimento do artista para propor uma reflexão sobre comoções em massa no Brasil. Atesta a inexistência de nexo causal entre qualquer ato ou omissão que se impute ao recorrente qualquer suposto dano eventual sofrido pelos apelados.
Discordou do valor dos danos morais, pois se trata unicamente de crônica crítica, diversamente do que consta na jurisprudência colacionada na sentença, onde houve publicação de inverdades. Requereu, com isso, o reconhecimento da incompetência do juízo de primeira instância. Em contrarrazões, às vítimas pugnaram pelo conhecimento e desprovimento da insurgência.
Decisão
Ao analisar os autos, a desembargadora (foto à direita) argumentou que o jornalista abusou do direito de transmitir informações através da imprensa, não se atendo a narrar e a licitamente valorar fatos relativos à morte do artista e sua repercussão, obtendo ampla repercussão em virtude da comoção social da qual zombava e da condição musical do falecido e de seu suposto não merecimento de comovente funeral público, em desrespeito à família e ao seu luto.
Ressaltou que a alegação de inexistência da responsabilidade civil por dano moral, no que tange ao conteúdo jurídico-normativo do regular exercício do direito de imprensa e à possibilidade de responsabilização dos veículos de comunicação e de seus prepostos, não demanda o reexame do conjunto probatório, visto que os fatos não são controvertidos.
De acordo com ela, o direito à liberdade de pensamento goza de primazia desde que o pensamento exteriorizado seja verdadeiro, isento de influências, apresentado em linguagem correta e com moderação e que evite atitude que possa revelar ensaio sensacionalista. Ainda que ingresse na órbita privada de alguém, se os meios de comunicação mantêm essas pautas, não existe agressão à dignidade humana.
“A crônica desmerece inteiramente a imagem de Cristiano Araújo com uso de “subterfúgios e tom despropositadamente escandalizado ou artificioso e sistemática dramatização” para dizer que o público e os fãs não eram dele, mas sim pessoas carentes de paixões e heróis e, tão somente por isto, arrastaram-se ao seu velório”, explicou.
Para ela, o jornalista passa a desenvolver uma narrativa que muito se afasta da realidade, da necessidade e da razoabilidade, agindo, evidentemente, distante da margem tolerável da crítica, transformando a publicação em verdadeiro escárnio com a instituição policial e, principalmente, em relação a seu dirigente maior à época, o ora recorrente, condutor das atividades investigativas colocadas à prova pelo jornalista.
Segundo a magistrada, mostra-se necessária a manutenção da decisão de primeiro, tendo em vista as circunstâncias que envolveram o fato, as condições pessoais, econômicas e financeiras dos ofendidos, assim como o grau da ofensa moral e a preocupação de não se permitir que a reparação transforme-se em fonte de renda indevida, nem seja tão irrisória que passe despercebida pela parte ofensora, consistindo, destarte, no necessário efeito pedagógico de evitar futuros e análogos dos fatos, já que este valor observa bem o princípio da razoabilidade, não levando à ruína a parte apelante, nem significando fonte de enriquecimento ilícito dos apelados.
Sobre o pedido de redução dos honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da indenização, tenho que não merece reparos. “Assim, tenho que os honorários advocatícios devem ser mantidos em 15% sobre o valor da condenação, pois refletem remuneração justa e consentânea aos ditames legais, assim como reflete o tempo de duração do feito e o bom trabalho realizado pelos procuradores.