O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou mais 42 pessoas envolvidas nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, entre elas a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, responsável por vandalizar a estátua “A Justiça” usando um batom, condenada a 14 anos de prisão. Ela escreveu a frase “Perdeu, Mané”, fazendo provocação à expressão dita pelo ministro do Supremo Luís Roberto Barroso após derrota eleitoral de Jair Bolsonaro em 2022.
Para 40 das pessoas condenadas, as penas foram fixadas em um ano de detenção, substituída por restrição de direitos. Uma foi condenada a dois anos e cinco meses de detenção (AP 1231). Já Débora, teve a pena arbitrada em 14 anos por cinco crimes (leia adiante) e deve perder o benefício da prisão domiciliar autorizada pelo STF no final de março.
Os julgamentos foram realizados em sessões virtuais do Plenário e da Primeira Turma concluídas nos dias 4, 11, 24 e 29 de abril e 6 de maio. O resultado do julgamento de terça foi divulgado pelo Supremo nesta quarta (7).
Autoria coletiva
Em todas as ações penais, prevaleceu o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, no sentido de que o grupo do qual os réus faziam parte “tinha intenção de derrubar o governo democraticamente eleito em 2022”. Ele observou que, conforme argumentado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), ocorreu um crime de autoria coletiva em que, a partir de uma ação conjunta, todos contribuíram para o resultado.
As defesas alegaram, entre outros pontos, que os atos não teriam eficácia para concretizar o crime de golpe de Estado e que os acusados pretendiam participar de um ato pacífico. Negaram, ainda, o contexto de crimes de autoria coletiva.
Provas explícitas
No oposto do que disse a defesa, o relator lembrou que a PGR apresentou provas explícitas produzidas pelos próprios envolvidos, como mensagens, fotos e vídeos publicados nas redes sociais. Além disso, também existem registros internos de câmeras do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do STF.
Para somar o conjunto de provas, existem vestígios de DNA encontrados nesses locais, além de depoimentos de testemunhas.
Recusa a acordo que evitaria condenação
Para agravar, os 41 sentenciados que cometeram crimes de menor gravidade rejeitaram o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), proposto pela PGR para evitar a continuidade da ação penal e assim o registro de antecedentes criminais. Esse acordo permitiria a esses investigados cumprir condições específicas, como reparar o dano causado, para que a ação penal fosse encerrada.
A denúncia aponta que os 41 permaneceram no acampamento montado no Quartel General do Exército, em Brasília, enquanto outro grupo se deslocou para a Praça dos Três Poderes e invadiu e depredou os prédios do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do STF.
“Além da pena de um ano de detenção pelo crime de associação criminosa, substituída por restrição de direitos, eles terão de pagar multa de 10 salários mínimos pelo delito de incitação ao crime, por terem estimulado as Forças Armadas a tomar o poder sob a alegação de fraude eleitoral”, informou o STF.
Para o réu na AP 1231, condenado pelos mesmo delitos, foi fixada pena maior (dois anos e cinco meses, em regime inicial semiaberto) porque ele descumpriu as medidas cautelares estabelecidas anteriormente, como comparecimento em juízo e uso de tornozeleira eletrônica, o que inviabiliza a substituição da pena.
Indenização
Todos os sentenciados por crimes menos graves cometidos nos atos de 8/1 também terão de pagar uma indenização no valor de R$ 5 milhões.
Esse valor será dividido com os outros condenados pelo STF pelos mesmos delitos.
Perda do réu primário
Mesmo com a substituição da pena de detenção, os envolvidos perderão os bons antecedentes e deixarão de ser réus primários quando se encerrar a possibilidade de recursos e a decisão se tornar definitiva (trânsito em julgado).
O ministro Alexandre de Moraes reiterou que mais de 500 pessoas em situação idêntica optaram por confessar a prática dos crimes e firmar o ANPP. Esses, portanto, ficaram sem antecedentes criminais anotados pelos crimes cometidos nos atos golpistas.
Caso Débora
A defesa sustentava no STF que a cabeleireira Débora Rodrigues não teve intenção de danificar a escultura da Justiça durante os atos antidemocráticos, por isso usou um meio (batom) que não é permanente. Eles pediram o afastamento da acusação de dano ao patrimônio argumentando que, após a lavagem, nenhuma marca permaneceu na estátua.
Débora não recebeu uma proposta de acordo de não persecução penal, segundo a PGR, devido à natureza dos crimes dos quais ela foi acusada. Isso porque eles somam pena superior a quatro anos de prisão e emprego de violência, elementos que vedam a apresentação do acordo.

Em seu voto, o relator afirmou que o caso dela não apresenta diferenças significativas em relação aos mais de 470 outros julgados pelo STF relacionados a pessoas que participaram da invasão dos prédios da Praça dos Três Poderes. “Todos tiveram denúncias recebidas por abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado, além de dano contra o patrimônio da União, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa”.
Além disso, Moraes ressaltou no STF que Débora foi identificada por fotos e que ela confessou ter vandalizado o monumento com batom durante os atos antidemocráticos. O relator ainda destacou que a análise do celular da acusada mostrou lacunas que sugerem tentativa de ocultação de provas.
A pena total da cabeleireira é composta por 12 anos e seis meses de reclusão, mais um ano e seis meses de detenção e pagamento de 100 dias-multa, além da indenização. O início do cumprimento será em regime fechado.
Recursos
O voto do relator foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin e pela ministra Cármen Lúcia. O ministro Luiz Fux divergiu e propôs a condenação da cabeleireira a um ano e seis meses de reclusão, unicamente pelo crime de dano ao patrimônio.
É possível às defesas dos condenados interporem recursos internos no STF para buscar a reforma ou reconsideração dessa decisão da Primeira Turmas. Esses recursos podem ser via agravo regimental, embargos de: declaração, infringentes ou de divergência – os dois últimos podem chegar ao Plenário da Corte.
Leia mais sobre: Direito e Justiça / Política