Poucas horas após virar réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) negou nesta quarta-feira (26) que tenha liderado ou participado da mobilização. Ele disse também que as acusações contra ele são “graves e infundadas”. Além disso, repetiu ofensas a instituições, autoridades do Judiciário, Imprensa e voltou ao argumento contra as urnas eletrônicas, até hoje baseado em fake News.
Bolsonaro falou aos jornalistas na porta do Senado. De lá, no gabinete do filho, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ele assistiu à sequência da sessão da Primeira Turma do Supremo que aceitou a denúncia e considerou reús todos os acusados do chamado “Núcleo Central” ou núcleo 1 dos denunciados, do qual é a figura de maior destaque.
“Eu espero hoje botar um ponto final nisso aí. Parece que tem algo pessoal contra mim. A acusação é muito grave, e são infundadas. E não é da boca para fora”, afirmou Bolsonaro. Nesta quarta, ele se tornou o primeiro ex-presidente a ser julgado pelo STF por tentativa de golpe de Estado.
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Apesar das provas contra ele apresentadas pela Polícia Federal (PF) e pela Procuradoria-Geral da República (PGR), na entrevista Bolsonaro chegou a dizer que, enquanto estava na Presidência, pediu a desmobilização de movimentos que pediam intervenção militar no país. Também afirmou que colaborou com a transição do governo dele para o de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Bolsonaro afirma que não há provas de que ele liderou tentativa de golpe
Ele considera que a investigação não encontrou provas de que ele liderou. “E nenhum dos acusados me apontou ele como líder de um golpe”, afirmou o ex-presidente, a despeito de ser apontado como líder na denúncia relatada pelo ministro Alexandre de Moraes.
“Golpe tem povo, mas tem tropa, tem armas e tem liderança. Um ano, dois anos de investigação, não descobriram quem porventura seria esse líder”, declarou Bolsonaro.
O ex-presidente lembrou o pronunciamento que fez no Palácio da Alvorada no dia 2 de novembro, logo após ter sido derrotado por Lula na eleição presidencial de 2022.
Ele afirmou que, na ocasião, disse que manifestações pacíficas eram bem-vindas e que atos não podiam resultar em invasão de propriedade, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir.
“Ato contínuo, começamos a transição. Alguns dias depois desse pronunciamento, os caminhoneiros começaram a obstruir vias pelo Brasil. Eu fiz um vídeo pedindo que eles desmobilizassem. Não tinha intenção nenhuma em parar o Brasil, criar um caos ou estava pensando em outra coisa”, prosseguiu.
Ex-presidente insiste que apoiou transição pacífica para governo Lula
Além disso, argumentou que, durante a transição governamental, reuniu-se com José Múcio Monteiro, escolhido por Lula para assumir o Ministério da Defesa e que este pediu “um apoio” a ele.
“Ele [Múcio] foi pedir um apoio para mim, para que tivesse mais acesso aos respectivos ministérios. No dia seguinte, foi atendido em tudo. Voltou, depois, a entrar em contato conosco e pediu que eu nomeasse os comandantes militares indicados pelo presidente eleito, Lula da Silva. Foi o que eu fiz. Em dezembro, nomeamos dois comandantes. O outro saiu mais no final. Atendi ao presidente Lula. Se tivesse qualquer ideia de força, não deixaria os comandantes do Lula assumirem”, afirmou.
Já a acusação da PGR que pediu para que Bolsonaro virasse réu no STF, aponta que ele não tomou ações para tirar acampamentos golpistas da frente dos quartéis do Exército país afora. Além disso, com base na investigação realizada pela PF, a acusação sustenta que em pleno período da transição para o governo de Lula, Bolsonaro manteve reuniões com assessores e militares para tramar o golpe de Estado. Provas dessas reuniões e a delação premiada do ex-ajudante de ordem de Bolsonaro, Mauro Cid, convenceram os ministros a respeito dessa trama.
O ex-presidente justificou que não preferiu não acompanhar a sessão no STF nesta quarta falando em perseguição. “Sabia o que ia acontecer” [se tornar réu]. Além disso, falou que parece que há algo “pessoal” contra ele.
Crítica às urnas no mesmo dia em que Trump elogia sistema brasileiro
No pronunciamento que fez nesta quarta, Bolsonaro mais uma vez levantou suspeitas infundadas e fez acusações já desmentidas contra as urnas eletrônicas.
“Não sou obrigado a confiar, a acreditar no programador [das urnas]. Confio na máquina, não sou obrigado a confiar no programador”, disse.
A declaração, ironicamente, veio no mesmo dia em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a quem Bolsonaro reverencia como exemplo de líder político, fez um elogio público aos sistemas eleitorais da Índia e do Brasil, por conta do uso de biometria. Como uma alfinetada em Bolsonaro, o elogio foi lembrado durante o julgamento dessa quarta no STF.
Minuta do golpe que consta nas provas que tornaram Bolsonaro réu no STF
Na declaração que fez à imprensa logo após se tornar réu, e que acabou sem direito a perguntas dos jornalistas, Bolsonaro comentou sobre a “minuta do golpe”. Trata-se do documento encontrado durante as investigações que previa intervenção das Forças Armadas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O ex-presidente disse que não assinou a minuta e justificou que a medida seria viável se fossem convocados os conselhos da República e da Defesa para dar andamento à ideia.
“Aí seria o primeiro passo. Não adianta botar um decreto na frente do presidente, de estado de Defesa e assinar que está resolvido. Não convoquei os conselhos da República e da Defesa. Nem atos preparatórios houve pra isso. Se é que você trabalhar com um dispositivo constitucional é sinal de golpe. Golpe não tem lei, não tem norma”, afirmou.
Ele continuou a explicação afirmando que, em sua interpretação, “golpe tem conspiração com a imprensa, o parlamento, setores do Judiciário, setores da economia, [de] fora do Brasil. Forças Armadas em primeiro lugar, sociedade, empresários, agricultores. Aí você começa a gestar um hipotético golpe. Nada disso houve”.
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