23 de maio de 2025
Publicado em • atualizado em 20/04/2025 às 09:55

O gigantesto projeto de Mabel para o lixo de Goiânia que nenhum outro prefeito ousou

prefeito de Goiânia Sandro Mabel visita empresa de lixo na Itália (foto divulgação)
prefeito de Goiânia Sandro Mabel visita empresa de lixo na Itália (foto divulgação)

Desde a gestão do ex-prefeito de Goiânia, Darci Accorsi tem sido divulgado de forma repetitiva que novos projetos poderiam reformular e criar alternativas para o “rico lixo de capital”. A gestão da prefeitura de Goiânia, entre 1993 e 1996, implantou o atual aterro sanitário da capital que, à época, seria uma solução para o lixo da cidade por 50 anos. Não chegou a tanto. A cidade conviveu, efetivamente, com um lixo que nunca chegou a adotar as tecnologias faladas ao longo do tempo. Agora, a bola do lixo está com o prefeito de Goiânia, Sandro Mabel (UB), que promete uma solução definitiva e é uma esperança para a cidade.

Na tarde de sábado, 19/04/25, falando ao Diário de Goiás direto da Itália o administrador exibia, empolgado, as tecnologias e a estrutura vistas na empresa AMSA, que cuida do lixo de Milão e outras cidades. (Abaixo, confira a reprodução da entrevista). A empresa é literalmente, uma indústria de processamento do lixo coletado nas casas com tecnologia que explora a riqueza que circula entre as casas e o local e a empresa.

Mabel exibia, com especial animação, que é possível fazer uma licitação internacional para que Goiânia esteja aberta a novas tecnologias de gestão do lixo que sejam ambientalmente coerentes com os tempos atuais e não um lixão como temos hoje.

Os ex-prefeitos de Goiânia receberam, com frequência, empresas interessadas em atuar na área, mas nenhum levou o assunto para a dimensão que ele tem para a cidade. Ademais, não é um projeto para uma gestão. Nem Nion Albernaz, que no máximo terceirizou a coleta do lixo para a Enterpa (Depois Qualix). Nem Pedro Wilson que iniciou o projeto Macambira-Anicuns, mas não resolveu a situação do lixo. Paulo Garcia (PT) conviveu e foi atingido pelas crises na coleta e na gestão da COMURG. Rogério Cruz também sofreu o mesmo que o petista.

Por último, e por três gestões, Iris Rezende (MDB) que nunca abriu espaço para um projeto que desse o devido tratamento ao lixo da cidade. Literalmente, não era um dos assuntos que ele demonstrasse empolgação, mas no meio da crise da coleta limitou-se a comprar uns 70 caminhões. Não foi uma gestão de grandes projetos e, a história está aí, na área ambiental não foi um forte incentivador do Macambira-Anicuns.

Agora, o que é esperado de Sandro Mabel é que tome a iniciativa de desenvolver o projeto que Goiânia merece para o lixo. Na entrevista, o prefeito demonstrou vontade. Ao jeito dele, gosta de tomar grandes desafios. E este não é para apenas uma gestão. A solução exige uma visão do tipo “pensar grande”. E, Mabel tem esse estilo.


ENTREVISTA / SANDRO MABEL – PREFEITO DE GOIÂNIA

Altair Tavares: Prefeito, dentro da visita que o senhor fez para entender como se aproveita o lixo em larga escala, como é feito nessa empresa, o que é possível implementar em Goiânia?

Sandro Mabel: Eu vejo como uma grande evolução. Essa empresa que visitamos aqui em Milão é uma referência. Eles ( AMSA – Empresa Milanesa de Serviços Ambientais) coletam todo o lixo da cidade e também da região metropolitana.

Eles têm um número de caminhões compactadores muito superior ao que temos em Goiânia, mesmo sendo cidades de tamanhos semelhantes. A tecnologia de recuperação que eles utilizam permite o aproveitamento de 100% do lixo. Ou seja, nada vai para aterro — aqui não existe aterro sanitário.

Eles conseguem reciclar 67% de todo o material recolhido. O restante, que não é reciclável, é incinerado para geração de energia, o que representa uma fonte importante de receita para a empresa. E essa queima é feita com tratamento adequado, sem poluir o ar. Então, aqui o conceito é de “lixo zero” — todos os dias eles eliminam completamente os resíduos.

Essa é a visão que estamos perseguindo em Goiânia. Já recebemos três ou quatro propostas de empresas, inclusive de duas com quem tivemos reuniões: uma coreana e outra que tem participação de uma empresa do Ceará. Pedimos a elas que não apenas tratem o lixo recolhido diariamente, mas também que retirem entre 10% e 20% do lixo que hoje está depositado no aterro, para também processá-lo.

Se recolhemos, por exemplo, mil toneladas por dia, essas empresas poderiam retirar outras 100 a 200 toneladas do aterro existente, reduzindo gradativamente esse passivo ambiental. Com o passar dos anos, o aterro seria completamente desativado. Não precisaríamos mais gastar com sua manutenção pelos próximos 25 anos.

A ideia é que, a partir da implantação desse modelo, Goiânia caminhe para o “lixo zero” e o “aterro zero”. Ou seja, não teremos mais aterro na cidade — o lixo será totalmente reaproveitado.

Altair Tavares: E o caminho para chegar a esse modelo seria por meio de uma licitação internacional para concessão do tratamento do lixo?

Sandro Mabel: Isso, mais ou menos é por aí. Primeiro, é preciso fazer uma modelagem desse processo. Mas, de forma geral, sim — seria uma licitação internacional para que empresas interessadas possam apresentar seus projetos. A prefeitura faz um termo de referência com base em uma tecnologia que esteja disponível para mais de três ou quatro empresas — não pode ser algo que só uma empresa tenha — justamente para permitir concorrência e obter a melhor oferta possível.

Só para você ter uma ideia: aqui em Milão, a empresa responsável pela gestão de resíduos é municipal. A prefeitura detém 50,2% das ações, e o restante é negociado em bolsa. No ano passado, essa empresa teve um lucro de 800 milhões de euros.

A coleta de resíduos aqui não se limita ao lixo comum. Eles recolhem restos de poda de árvores, madeira, móveis e muitos outros materiais. E conseguem transformar tudo isso — além de eliminar os custos para a prefeitura, ainda geram lucro. Como eu disse, 800 milhões de euros por ano. É um modelo muito bem estruturado.

Claro que tudo isso envolve o pagamento de uma taxa pelo contribuinte. Hoje, a taxa de lixo em Milão é cerca de sete a oito vezes maior do que a menor tarifa que temos no Brasil. Além disso, eles têm um sistema de cobrança embutido em diversos produtos: por exemplo, ao importar um controle remoto, já estão incluídos alguns centavos de euro que a empresa vendedora tem que repassar ao município, como forma de custear o descarte e o tratamento adequado daquele item.

Aqui, todo o lixo recebe a destinação correta: eletrônicos, geladeiras, móveis, madeira — tudo. Então, quando alguém compra qualquer produto no supermercado, o custo do descarte já está embutido no preço.

Essa ideia de logística reversa que temos no Brasil funciona de forma diferente aqui. Em vez de esperar que o fabricante recolha o item depois do uso, a própria empresa pública de resíduos já faz todo o processo de aproveitamento e destinação — seja reciclando, seja incinerando.

Hoje, cerca de 67% de todo o material é reciclado. Os outros 33% viram energia.

Altair Tavares: Outros prefeitos também receberam propostas, fizeram visitas e ouviram ideias para reorganizar a situação do lixo em Goiânia, certo? Alguns nem deram atenção — opinião minha, inclusive —, houve resistência. O senhor acredita que conseguirá superar essa barreira, essa resistência, ou até mesmo o gigantismo desse projeto?

Sandro Mabel: Sim, acredito que sim. Na verdade, todos esses projetos não envolvem recursos do município. A empresa que entra no processo é quem faz o investimento. Agora, isso não quer dizer que não exista custo — alguém paga por isso. Aqui, por exemplo, tudo funciona por meio de taxa. Essa taxa é repassada à empresa responsável pela coleta e pelo aproveitamento dos resíduos.

Ela recebe por esse serviço e também consegue gerar receita com a venda dos materiais recicláveis. As usinas que eles possuem aqui, só para você ter uma ideia, processam 24 tipos diferentes de plásticos — ou polímeros, como eles chamam. O PET é processado em uma usina, o PVC em outra, o polietileno em outra, o polipropileno em outra, e assim por diante.

Inclusive, o custo da embalagem influencia nesse processo. Quando uma empresa vende um produto com embalagem multicamadas — como o tetrapak, por exemplo, que tem cinco ou seis camadas —, ela paga mais caro, justamente porque esse tipo de embalagem é mais difícil de reciclar.

Eles estão nos enviando todo o material técnico, inclusive as campanhas educativas que fazem, porque aqui há um trabalho muito forte de conscientização da população. As pessoas já separam o lixo em seis tipos diferentes dentro de casa.

Os caminhões passam duas vezes por semana: em um dia recolhem o lixo orgânico, no outro, os recicláveis, divididos em categorias. Por exemplo, em um dia recolhem papel, vidro e latas; no outro, plástico e outros materiais. Quando o caminhão chega à central, já descarrega diretamente nas baias específicas — o vidro vai direto para o caminhão que o leva à fábrica responsável pelo processamento.

É um sistema muito bem organizado, realmente impressionante. Eles estão nos enviando tudo — desde a regulamentação até como a empresa foi constituída. Essa empresa já tem 15 anos de atuação.

Essas visitas ao exterior são importantes por isso: voltamos com muito material que nos ajuda a tomar decisões.

A gestão do Sandro Mabel vai resolver a questão do lixo em Goiânia. O que não foi feito no passado, nós vamos fazer agora. Vamos acabar com o aterro sanitário e transformar Goiânia em uma cidade lixo zero.

Vamos atrair investidores — eles existem — e implantar esse modelo. Agora, claro, isso não se faz da noite para o dia. É um processo. Mas é totalmente possível e atrativo. No mundo, há empresas interessadas em projetos assim.

Vamos trabalhar com força nesse tema. Até o fim deste ano, vamos resolver a situação do atual aterro. Vamos dar viabilidade a ele, acabar com o lixão que existe hoje.

Já assumimos as balanças, já instalamos novas balanças para controle do lixo. O senador Vanderlan destinou 14 milhões de reais em máquinas especializadas. Os tratores de esteira, por exemplo, são próprios para operação em depósitos de lixo. Também recebemos caminhões e três pás carregadeiras grandes, que estão nos ajudando.

Estamos organizando o depósito para que ele funcione como um verdadeiro aterro sanitário, e não como um lixão. Dentro disso, temos a proposta de deixar de enviar lixo para esse local, conforme avançarmos na instalação das unidades de reciclagem.

Vamos acelerar muito essa parte. Hoje reciclamos apenas 3%. Aqui em Milão, são 67%. Veja a diferença. Todo esse material que poderia ser reaproveitado, e que hoje vai para o aterro, pode ser retirado desse ciclo.

Também vamos tirar os RCCs — resíduos da construção civil — que estão misturados no aterro, e transferi-los para uma área própria.

Há várias mudanças previstas na gestão dos resíduos em Goiânia. E a principal conclusão que tiramos aqui é: o lixo pode ser fonte de receita, e o município pode se livrar desse problema.

Altair Tavares

Editor e administrador do Diário de Goiás. Repórter e comentarista de política e vários outros assuntos. Pós-graduado em Administração Estratégica de Marketing e em Cinema. Professor da área de comunicação. Para contato: [email protected] .