16 de março de 2025
FALA NO PÓS-GOLPE

Bolsonaro já tinha discurso pronto para depois do golpe, cita denúncia da PGR

Texto que ironicamente fala em “jogar nas quatro linhas” foi encontrado na sala do ex-presidente na sede do PL e também no celular do delator Mauro Cid
Bolsonaro já tinha discurso pronto, afirma PGR - Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil
Bolsonaro já tinha discurso pronto, afirma PGR - Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

Apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como o líder do plano golpista tramado entre 2022 e 2023, o ex-presidente Jair Bolsonaro já tinha um discurso pronto para ser lido se o golpe tivesse sido consumado. O discurso foi encontrado, segundo a denúncia da PGR, na sala de Bolsonaro dentro da sede do Partido Liberal (PL), e ainda no celular do ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid, principal delator no caso.

O plano envolvia a decretação de estado de sítio, a implementação da Lei da Garantia e da Ordem (GLO) e a convocação das Forças Armadas para garantir a GLO. Isso teria ocorrido após os assassinatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes que foram planejados pelo grupo golpista.

A denúncia apresentada pela PGR ao STF, na terça-feira (18) enfatiza esse ponto: “O discurso encontrado na sala de Jair Messias Bolsonaro reforça o domínio que este possuía sobre as ações da organização criminosa, especialmente sobre qual seria o desfecho dos planos traçados — a sua permanência autoritária no poder, mediante o uso da força”.

De acordo com a denúncia, as provas arrecadadas consistiam “num texto impresso sobre declaração de ‘Estado de Sítio’ e decretação de ‘Operação de Garantia da Lei e da Ordem’. Tratava-se do discurso a ser recitado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro no momento da efetivação do golpe de Estado. O mesmo texto também foi encontrado no aparelho celular de Mauro Cid”.

Discurso de quatro páginas

Um trecho do discurso, que tem quatro páginas, sinaliza a ideia de que a legalidade pode ser suprimida com naturalidade a partir de uma insatisfação. “Devemos considerar que a legalidade nem sempre é suficiente: por vezes a norma jurídica ou a decisão judicial são legais, mas ilegítimas por se revelarem injustas na prática. Isso ocorre, quase sempre, em razão da falta de constitucionalidade, notadamente pela ausência de zelo à moralidade institucional na conformação com o ato praticado”, diz o trecho.

Depois ele acrescenta que tais decisões, como a que rejeitou ação do PL contra o resultado das urnas, “colocam em evidência a necessidade de restauração da segurança jurídica e de defesa às liberdades em nosso país”, em uma declaração explícita de inconformidade e rebeldia ao ordenamento jurídico brasileiro.

Discurso defende que Moraes não poderia presidir o TSE

No discurso, o ex-presidente argumenta que o “Princípio da Moralidade Institucional” teria sido violado por decisões de tribunais superiores. O texto também defende que o ministro Alexandre de Moraes não poderia presidir o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), além de criticar decisões do Tribunal.

Além disso, o discurso cita decisões do STF e conclui pela necessidade de um estado de sítio. “Diante de todo o exposto e para assegurar a necessária restauração do Estado Democrático de Direito no Brasil, jogando de forma incondicional dentro das quatro linhas, com base em disposições expressas da Constituição Federal de 1988, declaro Estado de Sítio; e, como ato contínuo, decreto Operação de Garantia da Lei e da Ordem”.

Medidas prevendo Forças Armadas para garantir golpe estavam em outro documento

Um outro documento apreendido na sede do PL, dessa vez na mesa de um assessor do general Walter Braga Netto – mais um denunciado pela PGR por tentativa de golpe de Estado -, revela medidas duras que a suposta organização criminosa planejava para consolidar o poder.

Intitulado Operação 142, em referência ao artigo 142 da Constituição [disciplina o uso das Forças Armadas para garantia da lei e da ordem], o documento previa uma série de medidas drásticas para o golpe de Estado, tais como anulação de eleições e substituição de magistrados.

Restrição das instituições democráticas

A denúncia da PGR cita: “O plano também previa ações claramente voltadas à restrição de exercício das instituições democráticas, como ‘Anulação das eleições’, ‘Prorrogação dos mandatos’, ‘Substituição de todo TSE’ e ‘Preparação de novas eleições’”.

Além disso, no tópico  denominado “Linhas de esforço”, as medidas propunham ações de interrupção do processo de transição de governo; mobilização de juristas e formadores de opinião; e enquadramento jurídico do decreto 142. Para a PGR, medidas que tornam “evidente o escopo do grupo de depor o governo legitimamente eleito e permanecer no poder de forma autoritária”.

O que dizem as defesas de Bolsonaro e Braga Neto

Em notas publicadas pela Agência Brasil, a defesa do ex-presidente informou ter ficado “estarrecida e indignada com a denúncia” apresentada nesta terça-feira. Assinada pelo advogado Paulo Cunha Bueno, a nota afirma que Bolsonaro “jamais compactuou com qualquer movimento que visasse a desconstrução do Estado Democrático de Direito ou as instituições que o pavimentam”.

A defesa de Braga Netto afirmou que a denúncia é “fantasiosa” e “não apaga a sua história ilibada de mais de 40 anos de serviços ao Exército brasileiro”.

“O general Braga Betto está preso há mais de 60 dias e ainda não teve amplo acesso aos autos, encontra-se preso em razão de uma delação premiada que não lhe foi permitido conhecer e contraditar”, diz a defesa.

Os advogados do general, José Luis Oliveira Lima e Rodrigo Dall’Acqua, dizem ainda confiar que Braga Netto será inocentado. “A defesa confia na Corte, que o STF irá colocar essa malfadada investigação nos trilhos”, afirmaram.


Leia mais sobre: / / / Direito e Justiça / Política