Pela ótica dos trabalhadores de ao menos três dos maiores sindicatos de servidores públicos de Goiânia, os 100 primeiros dias do prefeito Sandro Mabel deixaram a desejar em diversos aspectos.
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Ouvidos pelo Diário de Goiás nesta segunda feira (7), o Sindicato dos Funcionários da Fiscalização Municipal (Sindiffisc), Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sintego) e Sindicato dos Trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SindSaúde), analisaram os primeiros três meses de Mabel. O Sindicato dos Trabalhadores do Município (SindiGoiânia) não retornou.
A presidente do Sindiffisc, Tatiane Karoline Cândida Guimarães, avaliou um aspecto positivo que foi o respaldo e autonomia para os auditores fiscais na nova Secretaria de Eficiência. “Lá o trabalho tem sido muito bom. Mas temos dois lados. Enquanto na Eficiência temos nomeações de cargos com base em critérios técnicos e autonomia para fazer o que precisa ser feito, na fiscalização da saúde pública, que está hoje na Vigilância Sanitária, está ruim”, apontou ela.
De acordo com Tatiane, inclusive nomeações não técnicas na Vigilância Sanitária ocorreram na pasta, ligada à Secretaria Municipal de Saúde. Além disso, Tatiane explica que a falta de nomeação para cargos de diretoria, gerência e coordenadorias de fiscalizações “está impedindo todo o trabalho da fiscalização de Vigilância Sanitária durante esses 100 dias de governo que passaram”.
Alvarás parados sem renovação
Ocorre que, alerta ela, todos os alvarás que tinham prazo até dia 31 de março para serem renovados, ou seja, nos primeiros 90 dias do exercício atual, se transformaram em uma “demanda represada muito grande”.
Segundo a dirigente sindical, como o prazo de renovação dos alvarás já encerrou, várias renovações ainda não foram feitas e tem segmentos de empresas que necessitam do alvará até mesmo para comprar, não é só para vender. Tem segmentos de farmácia, de distribuidores…”, exemplificou.
Para agravar, ela destaca que dentro desses primeiros meses, também havia demandas internas e diligências que o Ministério Público solicita para a fiscalização, para a Vigilância Sanitária como um todo. Esse serviço não foi feito nem respondido, “com as devidas devolutivas”, indicou ainda. A consequência, alertou Tatiana, é de que a inação “vai incorrer até em responsabilização para a próprio Prefeitura, para o Secretário de Saúde”.
Segundo ela, a situação não pode ser resolvida com a incorporação desse serviço à Secretaria da Eficiência. O motivo é a ligação das questões legais inerentes às políticas do SUS, e políticas nacionais de Vigilância Sanitária, nas quais a Vigilância Sanitária do município é inserida.
Nomeação de pessoas não-técnicas
“A última Diretoria de Fiscalização que não foi nomeada com critério técnico foi na Vigilância Sanitária”, acrescentou. Segundo ela, esse servidor inclusive já foi afastado, mas ninguém foi nomeado para a substituição. “Só foi nomeada, na semana passada, a Diretoria de Licenciamento [da Vigilância Sanitária]. Mas é necessário a fiscalização, as gerências e as coordenadorias para conseguir dar conta de toda a demanda que tem lá”, completou.
Após a publicação inicial dessa reportagem, a presidente do Sindffisc informou na segunda-feira (7) a noite, que foram publicadas no Diário Oficial nomeações para a Diretoria de Vigilância Sanitária e Gerência de Fiscalização.
Tatiane lamentou que de modo geral vê como uma “bandeira, que o prefeito tenha levantado desde o início da gestão, de querer culpar os servidores públicos por todos os problemas enfrentados pelo município. Como se o servidor público fosse o vilão da história e não é. A gente entende que às vezes pode ser que haja problemas, mas a gente percebe que essa política dele de falar mal de servidor público, como se o servidor público fosse um vilão, tem causado até constrangimento para os servidores públicos”, reclamou.
Segundo ela, fiscais relataram que contribuintes desmoralizaram o servidores usando o argumento de ineficiência que Mabel atribui ao falar que eles não trabalham. “É um constrangimento só”, lamentou.
Desqualificação ofensiva dos servidores é apontada por diferentes sindicatos
Essa “desqualificação dos servidores por parte do prefeito” também é apontada pelo Sintego. A presidente, Bia de Lima, deputada estadual do PT, disse que até pediu em audiência que o prefeito modere o tratamento. “Eu falei, ‘para de bater no servidor público’. Todo mundo que entra na administração só sabe bater e culpar servidor público. Até parece que as mazelas da administração é culpa do servidor público, [as mazelas são] porque não tem gestão”.
Para Bia de Lima os 100 primeiros dias passaram em branco. “Nós não temos absolutamente nada, nós continuamos nas promessas. Não tem aceno efetivo ou concreto em nada. Nem do Piso dos professores, que tinha que ser a partir de janeiro, não tem. Nem do reajuste do plano de carreira dos administrativos também não tem. Na reestruturação das escolas e Cmeis continua tudo muito indefinido, só movimentando as pessoas. Tira fulano daqui, manda para lá, tira para cá, fecha ali (…) e assim, concretamente, para as escolas até agora eu não vi nada não. Se alguém ver, me conte”, ironizou.
A presidente do Sintego afirma que manteve duas reuniões nesses três meses com o prefeito e com a Secretária de Educação, Giselle Faria, “mas continua no nível da promessa (…). E isso é o que mais tem deixado a categoria insatisfeita, porque nós não estamos mais em campanha, mas fica parecendo que é como estivesse, porque não tenho nada ainda de concreto”.
Falta de servidores na Educação
Além disso, Bia de Lima destaca ainda que está faltando profissionais da estrutura das escolas e Cmeis. “Ele [o prefeito] não convocou os concursados que estavam aguardando chamar para tomar posse. Ele está chamando o processo seletivo, mas os concursados, não”, reclamou.
Bia qualificou as ações até aqui de tímidas. “Particularmente tenho achado tímidas as iniciativas, bem tímidas, uma indefinição a bem da verdade”. A dirigente reclamou respostas que segundo argumenta, “a lei já mandava ter determinado, ter agilizado, e aí fica essa indefinição a vida inteira, e aí o povo vai ficando infeliz e insatisfeito”, em referência à questão do piso da categoria.
Ela lamenta também a pressão em torno dos servidores afastados por problemas de saúde e reitera que a categoria se tornou alvo. Diante das diferentes pendências envolvendo o pessoal da Educação ela disse que espera ser chamada para novas rodadas de negociação, “mas não tem nada previsto”.
Postura tem sido fraca, aponta SindSaúde
O cenário de crise histórica na Saúde de Goiânia na visão da presidente do SindSaúde, Néia Vieira, deixou entre os servidores da Secretaria Municipal de Saúde uma expectativa que não se concretizou. “Esperávamos realmente que houvesse uma postura mais firme, mais decidida e com um direcionamento mais claro sobre as decisões e caminhos que a Prefeitura de Goiânia quer seguir em relação à saúde pública. Nós temos visto muitas falas, mas poucas ações”, declarou.
Ela também aponta a falta de nomeação de cargos importantes como um problema para as unidades de saúde. “Até hoje, nós não temos nomeados todos os gestores das unidades do município. Isso é fundamental para que a gente consiga fazer planejamento, monitoramento dos serviços, para que a gente consiga garantir o funcionamento adequado”, cita.
Além disso, também enfatiza que não aconteceu uma esperada reestruturação dos distritos sanitários. “Nem se discute se haverá essa reestruturação ou como ela será feita, enquanto Isso é de fundamental importância para a gente descentralizar as ações e garantir que elas cheguem na ponta [pacientes]”, ressaltou.
Sem reestruturação, não há pediatras em todas as unidades
Questionada sobre se isso não deveria ser depois dos 100 primeiros dias, Néia observou: “O que se ouvia era muito no geral. ‘Eu vou resolver o problema da saúde’. ‘A gente vai garantir atendimento em todas as unidades’. ‘Vai ter médico’. ‘Vai ter pediatra em todas as unidades’. ‘Vou abastecer as unidades’. Mas não havia uma coisa muito clara sobre o que seria feito. Mas quem conhece a saúde pública, sabe como funciona e sabe que nós temos uma organização em sete distritos sanitários. Se essa organização não for feita, a gente sabe que não caminha muito, você fica só na bravata”, afirmou.
Em seguida ela acrescentou que não há pediatras em todas as unidades. “Não aconteceu, nós não temos pediatras atendendo em todas as unidades. Nós temos clínicos atendendo pediatria em unidades que não estão estruturadas para atendimentos em pediatria. Onde falta, desde abocathes (cateter) com a espessura adequada para uma criança, até uma maca com proteção lateral para que essa criança não caia. Isso é o mínimo necessário”, exemplifica.
Categoria esperava diálogo e fim da precarização
Além disso, ela disse que havia uma expectativa entre os servidores, “de termos um processo mais democrático, mais transparente, mais dialogado. Nós não tivemos até hoje a possibilidade de dialogar com o prefeito, temos feito solicitações e tal, mas até agora nada”, afirma Néia.
Segundo ela, o pessoal da Saúde tem várias demandas de recursos humanos. “Nós temos déficit de recursos humanos na Prefeitura de Goiânia. A precarização dos contratos é algo que incide sobre a qualidade dos serviços prestados, [sobre] a continuidade dos serviços prestados. Então, essas questões precisam ser discutidas de forma transparente”, pontua.
Para agravar, a dirigente do SindSaúde afirma que a participação da Secretaria Municipal de Saúde no controle social, tem deixado a desejar. “Hoje nós temos conferências de saúde acontecendo, inclusive a Conferência de Saúde do Trabalhador, não tivemos ainda participação do Secretário de Saúde. Não se sabe que rumos a Secretaria de Saúde tem para tratar sobre a saúde do trabalhador”, frisa, acrescentando que a categoria possui altos índices de adoecimento e morte.
Indicações não-técnicas também na Saúde
A questão das indicações técnicas também foi apontada como falha nesse início da gestão de Mabel. “A gente tinha uma expectativa de ter gestores mais qualificados, porque inicialmente ouvimos, inclusive do secretário, que não iria colocar qualquer pessoa nas unidades, que [os indicados] teriam qualificação. E nós continuamos vendo o balcão de negócio com os cargos na Secretaria de Saúde. Isso é muito ruim. Isso desqualifica o planejamento, o atendimento. Quem sofre lá na ponta é o usuário”, lamentou.
Por fim, ela disse que acredita que possa haver melhorias implementadas no atual governo. “Você pode colocar aí que a gente ainda tem esperança nessa gestão”, concluiu Néia.
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